Medidas COVID-19: reequilíbrio financeiro de contratos de execução duradoura
Entrou em vigor na passada sexta-feira, dia 1 de maio de 2020, o Decreto-Lei nº 19-A/2020, de 30 de abril, que estabeleceu o regime excecional e temporário aplicável, no contexto da pandemia da doença COVID-19, aos contratos de execução duradoura em que o Estado ou outra entidade pública sejam parte, bem como à indemnização pelo sacrifício por ato praticado pelo Estado ou outra entidade pública no âmbito da prevenção e combate à pandemia.
Este diploma inclui medidas extraordinárias e temporárias que visam limitar os efeitos negativos que decorreriam para o Estado do acionamento, em simultâneo, do exercício de eventuais direitos compensatórios pelos contraentes privados sem qualquer restrição.
As opções aqui exercidas constituem uma limitação de direitos, revelando-se necessárias, adequadas e proporcionais aos fins que se visam alcançar e ao estado de exceção.
Assim, de 3 de abril até 2 de maio de 2020, determina-se a suspensão das cláusulas contratuais e disposições normativas que prevejam o direito à reposição do equilíbrio financeiro ou a compensação por quebras de utilização em qualquer contrato de execução duradoura, incluindo parcerias público-privadas, em que o Estado ou outra entidade pública sejam parte, não podendo os contraentes privados delas valer-se por factos ocorridos durante o Estado de Emergência.
Não obstante, fora do Estado de Emergência, estabelece-se que eventuais direitos à reposição do equilíbrio financeiro, fundados na ocorrência da pandemia COVID-19, apenas podem ser concretizados através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou de vigência do contrato, não dando lugar, independentemente de disposição legal ou estipulação contratual, a revisão de preços ou assunção, por parte do contraente público, de um dever de prestar à contraparte.
Por outro lado, foi estabelecido um regime adicional específico para os contratos de parceria público-privada no setor rodoviário, determinando-se que certas obrigações as obrigações das concessionárias e subconcessionárias rodoviárias, no âmbito dos respetivos contratos, devem ser temporariamente objeto de redução ou suspensão, a determinar e a concretizar, com urgência, pelo concedente ou subconcedente, tendo em conta, em particular, níveis de tráfego atualizados e consistentes com a realidade e os serviços mínimos a garantir para a adequada salvaguarda da segurança rodoviária.
Sempre que, nestes casos, a remuneração das concessionárias ou subconcessionárias advenha de pagamentos do concedente ou subconcedente, deve este adicionalmente determinar, de forma unilateral, a redução dos pagamentos devidos, na medida da redução ou suspensão das obrigações das concessionárias ou subconcessionárias.
Além do mais, veio adequar-se o disposto no artigo 20º do Decreto-Lei nº 111/2012 à situação de pandemia provocada pela doença COVID-19. De acordo com esse preceito, quando o parceiro público pretenda, nos termos fixados no contrato ou na lei, e sem prejuízo da observância do regime jurídico relativo à realização de despesas públicas, proferir uma determinação unilateral suscetível de fundamentar um pedido de reposição do equilíbrio financeiro do respetivo contrato de parceria, deve, previamente, estimar os efeitos financeiros decorrentes dessa determinação e verificar a correspondente comportabilidade orçamental.
Neste sentido, veio o Decreto-Lei nº 19-A/2020 determinar que tal não é aplicável a qualquer ato, medida, decisão ou outro tipo de atuação imputável ao parceiro público, incluindo de natureza regulamentar, adotado no contexto da pandemia da doença COVID-19, no âmbito de contratos de parceria público-privada ou com efeitos aplicáveis a esses contratos, dispensando-se, assim, a aplicação de qualquer procedimento ou formalidade que não se coadune com a necessidade e urgência da adoção de determinações de caráter unilateral no atual contexto. Tal produz efeitos à data de 13 de março de 2020.
Por fim, em matéria de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas pela prática de facto lícito, clarifica-se que, estando em causa danos que não preenchem um requisito de especialidade, a indemnização pelo sacrifício não é aplicável aos atos regularmente praticados no exercício das competências conferidas pela legislação de saúde pública e de proteção civil ou no quadro do Estado de Emergência, para efeitos da prevenção e do combate à pandemia COVID-19, que constitui para o efeito causa de força maior.
É de salientar que, aos litígios que venham a emergir da aplicação do disposto neste decreto-lei, será aplicável o nº 3 do artigo 185.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ou seja, decisão sobre o mérito da pretensão deduzida é suscetível de recurso, com efeito meramente devolutivo, para o Supremo Tribunal Administrativo.
O disposto neste diploma cessa a sua vigência quando a Organização Mundial de Saúde determinar que a situação epidemiológica do vírus SARS-Cov-2 e da doença COVID-19 não configuram uma pandemia, sem prejuízo dos efeitos nele previstos que, pela sua natureza, devam ser produzidos ou venham a ser efetivados após essa cessação.