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Transposição da Diretiva dos Acionistas II: incentivos e reforço de direitos dos acionistas em sociedades cotadas

A Diretiva dos Acionistas II (2007/36/CE), alterada pela Diretiva (EU) 2017/828 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de maio de 2017 foi transposta em Portugal pela Lei nº 50/2020, de 25 de agosto, relativa aos direitos dos acionistas de sociedades cotadas e incentivos ao seu envolvimento a longo prazo com a sociedade.

Esta lei alterou a redação do Código dos Valores Mobiliários, do Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo e do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

As alterações introduzidas visam criar um ambiente de maior transparência, quer quanto à gestão das sociedades cotadas, quer quanto ao envolvimento dos seus acionistas, criando direitos e obrigações para ambas as partes, com vista a promover uma lógica de envolvimento ativo, de investimento de longo prazo e um foco na sustentabilidade das empresas.

No que respeita às sociedades cotadas, entre as várias alterações, salientam-se as regras mais detalhadas sobre o conteúdo, aprovação e divulgação da política de remunerações, obrigando as sociedades a aprovar e divulgar uma política remuneratória aplicável aos membros dos órgãos de administração e fiscalização (say-on-pay), devendo as mesmas ser claras, compreensíveis e em linha com objetivos de sustentabilidade a longo prazo. Ademais, a administração deverá elaborar um relatório anual, explicitando como foi efetuada a aplicação da política de remunerações.

A nível de conteúdo da política de remunerações destacam-se ainda as obrigações de explicitar “a forma como as condições de emprego e de remuneração dos trabalhadores” foram consideradas, como a política contribui para “os seus interesses de longo prazo e para a sua sustentabilidade” e, caso existam, quais os critérios para atribuição de remuneração variável “relacionados com a responsabilidade social”. No que respeita à relevância do envolvimento dos acionistas neste tópico, note-se a necessidade de, em caso de revisão da política, as sociedades passarem a ter de descrever de que forma as alterações introduzidas “refletem as votações e as opiniões expressas pelos acionistas sobre a política de remunerações”.

Do lado dos investidores institucionais, gestores de ativos e consultores em matéria de votação, foram introduzidos deveres adicionais de transparência, passando a ser enviada a confirmação do voto expresso por via eletrónica.

Por outro lado, os investidores institucionais e os intermediários financeiros que prestem, em ações de sociedades cotadas, serviços de gestão de carteiras que incluam valores mobiliários, deverão elaborar e divulgar ao público uma política de envolvimento que descreva o modo como integram o envolvimento dos acionistas na sua estratégia de investimento e, posteriormente numa base anual, a forma como tal política foi aplicada.

Os intermediários financeiros que prestem serviços de gestão de carteiras por conta de outrem, na medida em que invistam em ações negociadas no mercado regulamentado em nome de investidores, informam anualmente o investidor institucional sobre a forma como a sua estratégia de investimento e a sua execução respeitam o acordado e contribuem para o desempenho de médio a longo prazo dos ativos do investidor institucional ou do fundo.

consultor em matéria de votação (proxy advisor) divulga anualmente ao público uma referência ao código de conduta que aplica e presta informações sobre a sua aplicação. A fim de informar adequadamente os seus clientes sobre a exatidão e a fiabilidade das suas atividades, divulga anualmente ao público informações relativas à preparação dos seus estudos, dos seus pareceres e das suas recomendações de voto.

A maioria destas informações são obrigatórias numa lógica “comply or explain”.

Finalmente, intermediários financeiros que prestem serviços de registo e depósito de instrumentos financeiros devem, quando tal for solicitado, prestar imediatamente à Interbolsa informação sobre a identidade de acionistas, assim como assegurar a transmissão de informação entre cotadas e acionistas. Em destaque, impede-se a cobrança de comissões por este tipo de serviços, já que se encontram limitados dado o sistema de “primeira camada”, ou seja, acionista registado.

Em suma, a Lei nº 50/2020, de 25 de agosto, que entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, isto é, dia 26 de agosto de 2020, criou a necessidade de alguma adaptação dos mecanismos internos das sociedades cotadas, de modo a dar cumprimento ao reforço dos deveres de transparência.