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Execução fiscal contra sucessores de responsável subsidiário falecido antes de operada a reversão fiscal julgada inconstitucional.

O Tribunal Constitucional decidiu, a 26 de abril de 2022, que é inconstitucional a interpretação no sentido de a obrigação tributária subsidiária ser transmissível em caso de sucessão por morte, quando a reversão é determinada após o falecimento do administrador ou gerente.

Neste caso um contribuinte, AA, foi chamado à execução para pagar dívidas tributárias em cobrança, considerando o órgão de execução fiscal que a responsabilidade subsidiária dos gerentes das pessoas coletivas transmite-se aos seus sucessores por morte, nos termos do artigo 29.º, n.o 2, da Lei Geral Tributária (adiante LGT), mesmo quando a reversão fiscal tenha ocorrido após o falecimento do responsável subsidiário.

AA, filha do gerente e sucessora, se opôs a esta interpretação da lei, argumentando que tal viola o direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto na Constituição, entendimento este que foi aceito pelo Tribunal Tributário de Lisboa, decidindo por não aplicar a interpretação extraída pelo órgão de execução fiscal por considerar desconforme à Constituição.

O Ministério Público recorreu desta decisão ao Tribunal Constitucional.

Assim, no caso em apreciação, estamos perante a seguinte questão: é ou não é constitucional a transmissão por sucessão (por morte) da responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores quando a reversão fiscal é operada após o falecimento do responsável subsidiário?

Reversão fiscal, de maneira resumida, é quando uma pessoa, que não é a devedora da relação tributária, é chamada a responder pelo devedor. Para esta reversão da dívida fiscal operar é preciso que seja comprovado no processo de execução fiscal que não existem bens penhoráveis do devedor ou que há fundada insuficiência do património do devedor para a satisfação da dívida a ser executada.

Neste caso a reversão operou-se com fundamento na alínea b) do n.o 1 do artigo 24.º da LGT, norma que, prevê uma presunção legal de culpa do gerente, o que determina a existência de um ónus da prova sobre o revertido: o revertido (no presente caso, o gerente) deve conseguir provar que a falta de pagamento das dívidas da pessoa coletiva não lhe é imputável, ou seja, que prove que não é culpa sua.

Sucede que o responsável subsidiário faleceu em 08.03.2005, antes mesmo de ser ordenada a reversão, o que na interpretação da administração tributária nada obsta que a responsabilidade da dívida seja transmitida, devendo por isso AA, enquanto sucessora e filha do responsável subsidiário, fazer a prova que que não foi imputável ao gestor falecido, seu pai, a falta de pagamento das dívidas da pessoa coletiva revertidas, sob pena da execução fiscal afetar a sua herança a receber.

O TC, no entanto, considera que, diferente do que se passa em relação ao responsável subsidiário em que há facilidade em provar que a culpa é ou não sua, nestes casos há uma natural dificuldade dos herdeiros em munir-se de meios e conhecimentos para demonstrar a ausência de culpa do gestor falecido.

“Em tais casos, com efeito, nem o pagamento da prestação tributária constituiu obrigação sua, nem praticaram factos passíveis de sanção. Acima de tudo – e é este o ponto decisivo – a imposição do ónus da prova poderá deixar os sucessores numa situação de quase impossibilidade de afastamento da presunção, pois nada garante que conheçam em pormenor a atividade de administração do falecido, pelo menos ao ponto de conseguirem demonstrar a ausência de culpa”, refere o TC.

Elucida o Tribunal que todo o sistema de ónus da prova não pode deixar de assentar estruturalmente no critério da facilidade probatória, o qual emerge e ganha visibilidade em todas as situações de presunção legal”.

Em suma, conclui o Tribunal que a interpretação contestada colocaria os sucessores do gerente ou administrador em uma posição que torna impossível ou, pelo menos, dificulta em enorme medida a sua defesa, o que entende ser desproporcional e intolerável perante a Constituição portuguesa.

O Tribunal Constitucional confirma, então, a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, declarando inconstitucional a interpretação invocada pela administração tributária.